É com grande satisfação e honra que o site Artes do Japão traz esta entrevista com Diogo Colela, atleta da Dupla Campeã Pan-Americana de Judo Kata. Dupla formada com Marcus Michelini, este Título foi conquistado no último mês de Abril em Havana, no primeiro dia do Campeonato Pan-Americano de Judo, evento que reuniu as grandes potências do Judo de todo Continente Americano.
1 – Artes do Japão: Conte um pouco sobre quem é o atleta Diogo Colela.
Me chamo Diogo Colela, tenho 31 anos e sou praticante de Judô desde meus 5 anos. Me formei em História e depois em Filosofia, mas passei a trabalhar como professor de Judô após um convite do meu Sensei para lecionar para crianças na escola. Desde então dou aulas de judô e minha área de formação se tornou um hobbie e o judô que sempre foi uma paixão na minha vida, tornou-se meu trabalho! Fui praticante de Kendo/Iaido por aproximadamente 15 anos onde alcancei o título de Shodan-Ho em Shinto-Ryu. Sou praticante também de Karate, estilo Goju-Ryu há pelo menos 8 anos, sob a tutela dos Senseis Horácio e Akira Saito.

2 – Artes do Japão: Qual a sua graduação e quando foi o início desta “parceria”?
Diogo Colela: Atualmente estou no 2ª Dan, mas pretendo fazer meu exame para 3ª Dan ainda este ano, em Outubro. Eu e o Marcus nos conhecemos há bastante tempo. Ele era professor no Clube Sírio quando passei a treinar lá. Ele já estava treinando com frequência os katas e precisava de alguém para servir de UKE (pessoa que recebe os golpes) para seu exame de graduação. Me convidou para participar dos treinos de kata com ele, para que assim, eu pudesse aprender e ajudar ele no exame. Isso foi em 2010. A partir daí, comecei a frequentar os treinos e passei a me interessar demais pelos katas. Começamos com o objetivo de estudar, conhecer e saber fazer os katas, mas não tínhamos a intenção de participar de uma competição. Mas depois de 3 meses de prática, nossos técnicos, Sensei Alcides Camargo e Sensei Luis Alberto dos Santos, viram que havia a possibilidade de nos especializarmos em um kata e nos tornar uma dupla competitiva.
3 – Artes do Japão: Para ser a Dupla titular da Seleção Brasileira no Judo Kata, o que foi necessário? Qual foi a trajetória?
Diogo Colela: Nós tivemos um longo caminho pra percorrer para poder ingressar em uma equipe de alto rendimento do kata brasileiro. Nos especializamos primeiramente no Kime-no-kata e passamos a disputar nessa categoria. Com os resultados positivos, passamos a estudar e logo após passamos a competir na categoria Kodokan Goshin Jutsu. A trajetória sempre foi árdua, principalmente pela falta de apoio e incentivo. Muitas vezes tivemos que deixar família e amigos de lado, para visar um treinamento mais focado para um campeonato importante. Desde o início, o foco não era apenas ganhar a competição, mas sair de lá satisfeito com a apresentação. Tivemos vários campeonatos em que perdemos, mas saímos bem da competição pois havíamos dado nosso máximo. O contrário também já aconteceu. Já ganhei e sai da competição mal. É estranho, mas sai mal porque sabia que apesar de ter ganhado a medalha de ouro, não tinha sido a minha melhor execução. Acho que o diferencial tem que ser esse. Nós somos o nosso referencial. Buscar aperfeiçoar a cada execução e tentar manter essa qualidade técnica sempre, mesmo sendo extremamente difícil fazer isso. Nunca nos abatemos pelas derrotas. Cada competição foi um aprendizado novo e acho que isso sempre nos impulsionou a buscar novos degraus. Passamos a disputar campeonatos mais difíceis como Copa São Paulo e Campeonato Paulista. Depois campeonatos Brasileiros, Sul-americanos e copas Pan-americanas. Ao sermos campeões brasileiros, conseguimos nossa vaga para o Pan-americano oficial da FIJ (Federação Internacional de Judô) e com o ouro, conquistamos a vaga para o Mundial, que este ano acontecerá em Malta, Itália. Acredito que o caminho seja esse, de muitos treinos, muitos sacrifícios, dedicação, investimento e entrega ao que está fazendo. Os resultados começaram a surgir e desde então buscamos manter o desempenho e qualidade das nossas apresentações.

4 – Artes do Japão: Para o público que só conhece o Judo como “luta” individual, o que é a competição de Judo Kata?
Diogo Colela: Eu entendo o kata como o refinamento de qualquer arte marcial. É aonde reside a essência da arte. Segundo Kano Sensei, os katas são a estética do Judô, sem o qual é impossível compreender todo seu alcance. Isso significa que o kata está intrinsicamente ligado com o treinamento mais profundo do Judô. É parte fundamental para o pleno desenvolvimento do praticante. No kata, o atleta demonstra conjuntos de técnicas fundamentais já determinadas, em duplas, onde um é o atacante (Uke) e o outro é o defensor (Tori). No judô, existem 8 katas que são reconhecidos oficialmente pelo Instituto Kodokan, onde estes são divididos de acordo com as habilidades técnicas a serem executadas: técnicas de projeção, domínio no solo, técnicas de defesas pessoais e técnicas baseadas nos elementos da natureza. Para o campeonato de Kata, somente os primeiros 5 katas são permitidos para apresentação.

5 – Artes do Japão: Como é a vida do atleta Diogo Colela, quando não está representando o Brasil em competições?
Diogo Colela: Sou um cara normal, trabalho muito e procuro manter meus treinos em dia. Sou professor de judô em escolas, onde leciono para crianças de 03 a 18 anos e ajudo meu Sensei no dojo com a turma dos adultos. Quando não estou treinando ou trabalhando, procuro passar meu tempo com minha família, esposa, sobrinhos e amigos. Além disso, estou me preparando para receber uma nova moradora aqui em casa! Minha primeira filha vai nascer e apesar de toda carga de trabalho e treino, preciso deixar um bom tempo para passar com ela.
6 – Artes do Japão: Como é a preparação física/técnica da Dupla e onde é feita esta preparação?
Diogo Colela: Tento manter uma boa preparação física, pois o trabalho do UKE é bem pesado! Mantenho uma rotina de treinos dentro e fora do tatame. Pratico o Judô quatro vezes na semana e ainda sou praticante de outras modalidades de lutas, como o Karate. Pratiquei o Kendo/Iaido por 15 anos, mas pela carga de treino e trabalho, precisei parar. Porém Isso me deu e ainda dá uma vantagem muito boa dentro do kata que fazemos, porque tanto o Kime-no-Kata, quanto o Kodokan Goshin Jutsu são katas de defesa pessoal, onde ataco o Marcus com socos, chutes, com faca, bastão, espada e até revólver. Procuro manter também uma rotina de treino nos intervalos de aulas que dou nas escolas que trabalho. Esse treino foi feito e é supervisionado pelo meu preparador físico Willian Chang, e é todo baseado nas minhas necessidades pra modalidade que exerço. Passei a usar com ele o kettlebell, que tem sido uma ferramenta extremamente versátil e poderosa nos meus treinos.
7 – Artes do Japão: O Judo é um esporte olímpico, e no Brasil, já um esporte consagrado, com importantes títulos e conhecido pelo público geral. Por que as competições de Judo Kata não tem a mesma conotação?
Diogo Colela: O Kata no Brasil ainda está engatinhando em relação à Europa ou mesmo o Japão. Infelizmente é uma parte do Judô que só é exigida nos treinamentos para o realização dos exames de graduação. Ou seja, até o aluno chegar a faixa marrom e ter a intenção de prestar exame para Shodan, ele raramente será apresentado aos katas. Além disso, acredito que tenha duas razões principais para que o campeonato de kata ainda não ser conhecido pelo público, ou até mesmo por muitos praticantes de Judô. O primeiro é o fato de não ser praticado, salvo pouquíssimas exceções, nas academias antes do exame de graduação. O treinamento ainda é muito focado na parte do Shiai (luta competitiva) em busca de resultados. A segunda razão, acredito que é pela subjetividade da própria competição. Nos campeonatos de Kata, existem de 3 a 5 árbitros que avaliam os atletas de acordo com a perfeição, eficácia, harmonia, entre outros fatores das técnicas aplicadas para assim chegar no resultado de campeão, vice e bronze. Essa avaliação é subjetiva, pois depende da interpretação de cada árbitro ali presente, bem como do conhecimento que o mesmo tem sobre o kata. Mesmo com uma padronização do que se deve ser avaliado, pode acontecer de um erro ter sido visto por um árbitro, mas não por outro, o que resultaria numa avaliação diferente. Além disso, a modalidade ainda não tem apelo para a mídia, por ser de difícil entendimento do público geral. Em uma competição de Shiai, por exemplo, se um atleta projetar seu adversário ao solo, ainda que sem a técnica perfeitamente executada, ele pode conquistar um ponto e assim vencer a luta. Já no kata não funciona assim. Por estar sendo avaliado pela8 perfeição e eficácia da técnica, o competidor não pode cometer erros de execução, pois estes custariam muitos pontos na nota final de sua apresentação. Em um campeonato de alto rendimento, com atletas de alto nível, a diferença entre as execuções do mesmo kata, só são visíveis para aqueles que já tem o “olho treinado” para aquilo. Sendo assim, para o grande público, seria muito confuso distinguir e saber o porquê um kata foi melhor que o outro, tornando assim um campeonato difícil de ser “vendido” para a televisão.
8 – Artes do Japão: Com a conquista deste título Pan-Americano, quais são os próximos objetivos da Dupla?
Diogo Colela: Buscamos agora uma conquista no campeonato mais importante da nossa categoria, o Campeonato Mundial. Já participamos em 2014 em Málaga, mas não obtivemos o resultado esperado. Apesar de termos a vaga para disputar esse campeonato em 2015 não conseguimos ir, pois não possuímos um patrocinador e o custo dessas viagens é alto demais. Esse ano, conseguimos participar do Pan Americano, pois tivemos ajuda de diversas pessoas. Pais de alunos das escolas que trabalho fizeram uma campanha entre eles e conseguiram levantar boa parte dos custos da viagem. Busco ainda visitar o Instituto Kodokan (primeira academia de Judô) no Japão e fazer o curso de especialização dos katas que faço. Precisamos aperfeiçoar mais nossos katas antes de tentarmos novamente o Mundial, pois o nível é altíssimo e como estamos sem patrocinadores fixos, não temos a facilidade de ir sempre a esse evento.

9 – Artes do Japão: Na opinião de vocês, que também são Sensei (professores), no que o Judo pode ajudar as pessoas e principalmente na educação das crianças?
Diogo Colela: O judô é uma poderosa ferramenta para formação das crianças e jovens. Para crianças, a prática do judô estimula e melhora as habilidades psicomotoras, o domínio corporal e desenvolve o aprendizado escolar. O judô auxilia na construção da confiança e autoestima das crianças, fazendo com que o praticante se torne mais sociável e possua bons relacionamentos. A filosofia do judô aplicada ao dia a dia, como o respeito ao próximo, trabalho em equipe, disciplina e equilíbrio mental são exemplos das qualidades que a prática proporciona aos jovens. A maior preocupação do Sensei Jigoro Kano ao criar o judô, era de fazer com que uma arte marcial tornasse possível tanto o desenvolvimento das habilidades técnicas do praticante, quanto a sua formação moral, cívica e ética. Esse é o foco das minhas aulas também. Antes de formar um atleta de alto rendimento, nossa preocupação é transforma-lo em um cidadão útil, respeitoso, justo à sociedade.
10 – Artes do Japão: Considerações finais, algumas palavras para as crianças que estão iniciando nas artes e os contatos para aulas e patrocínios.
Diogo Colela: Gostaria de dizer aos leitores, que nunca desistam de um sonho. Todo esforço para alcançar o que se deseja, é recompensado no final. Nunca foi fácil meu trajeto pelas artes marciais, nem sempre fui o melhor no que fazia. Sempre tive muita dificuldade na minha juventude durante os treinos. Não era o mais alto, não era o mais forte, muito menos o mais técnico, mas posso dizer que sempre fui um dos mais perseverantes. Portanto, nunca se entregue, nunca desista. A vontade e a persistência, somado com paciência e boa orientação, superam as dificuldades cotidianas. Meu Sensei me disse uma vez: “Caiu 7 vezes, levanta 8”. Esse é o nosso lema, nunca desistir! Não será fácil, mas posso te garantir, vai valer a pena!

Gostaria de agradecer também à minha família, meu Sensei Roberto Katchborian, meus técnicos Sensei Alcides Camargo e Sensei Luis Alberto dos Santos, aos meus amigos, alunos, pais dos meus alunos, à RIMOBLOCO, à equipe Mowii de Treinamento Integrado e a Power Fight, por todo apoio, torcida, investimento e carinho que tem por mim. Gratidão por vocês. Obrigado!
Para quem se interessar em nos patrocinar, meu e-mail é diogocolella@gmail.com
Telefone: 11 99361-6872
Facebook: Diogo Colella
Instagram: @colellajtk
O site Artes do Japão agradece imensamente ao atleta Diogo Colela pela entrevista enriquecedora e esclarecedora. Fazemos votos que a bandeira do Brasil esteja no local mais alto do Pódio no próximo mundial. Ganbatte kudasai!!!!!